Com base em pareceres médicos, um transexual garantiu na Justiça o direito de realizar depilação a laser pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A decisão da Justiça Federal mineira recebeu menção honrosa no I Concurso Nacional de Decisões Judiciais e Acórdãos em Direitos Humanos, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em parceira com a Secretaria de Direitos Humanos (SDH), na categoria Direitos da População LGBT – entregue na última terça-feira (14), na sede do Conselho.
Para realizar o tratamento, em grau de recurso, a decisão foi proferida pelo juiz federal Gláucio Maciel Gonçalves, da 1ª Turma Recursal de Minas Gerais, que manteve a decisão do Juizado Especial Federal de Juiz de Fora/MG.
A determinação foi baseada nas condições físicas e psicológicas do paciente que autorizariam a invocação da proteção ampla à saúde, prevista nos artigos 5°, 6° e 196 da Constituição/88. Partindo-se do princípio de que a garantia àquele direito deverá ser dada em sua mais ampla extensão, incluindo-se não só os medicamentos diretamente ligados ao combate de doenças, mas também os complementos necessários ao sucesso do tratamento médico.
Em última análise, “equiparou-se o pedido às demandas em que se pleiteia cirurgia plástica, cada vez mais numerosas no SUS e que têm por fim último a melhoria da qualidade de vida do paciente”.
O município de Juiz de Fora recorreu da decisão alegando que pelo fato de o autor ainda não ser uma mulher completamente, pois não fez a cirurgia transformadora, não se poderia dizer que ele padeceria de um mal exclusivamente feminino, previsto pelo legislador como autorizado de assistência gratuita, o que tornaria a decisão carente de fundamento legal e até mesmo lógico, tornando-a altamente reprovável.
Destacou o relator que por mais fútil que possa parecer, em princípio, autorização para um tratamento estético, a decisão tem o suporte de relatórios médicos, segundo os quais o recorrido padeceria de um mal semelhante à doença denominada “hirsutismo”, causadora de pelos indesejáveis no rosto das mulheres.
O magistrado registra que em épocas de discussão dos direitos das minorias que ocupa espaço na mídia e em debates jurídicos e acadêmicos o que se busca é garantir completamente ao indivíduo o direito à sua identidade mais básica, que é a do gênero, sem a qual ele jamais definirá quem ele será e que papel ocupará na sociedade.
Segundo o relator, o apelante sustenta que se trata de um procedimento puramente estético, sem importância, fora de contexto, desconsiderando o fato notório de que por trás da aparência do transexual esconde-se um histórico de humilhação e de forte rejeição por parte da sociedade. Portanto, “tentar minorar a dor desse indescritível sentimento de inadequação social, no encontro do cidadão com sua verdadeira identidade, é garantir o direito à saúde, cumprindo-se um dever do Estado”, registrou.
Ressalta também o magistrado que se o SUS fornece a possibilidade de custear a retirada de pelos para as mulheres que sofrem de “hirsutismo” como forma de crédito para quitação de imposto de ICMS de importação de aparelhos médicos de laser, nos termos da Resolução Estadual Conjunta nº 3.316/02, das Secretarias de Fazenda e Saúde de Minas Gerais, não há justificativa razoável para se negar o mesmo procedimento para aquele que nasceu homem, mas se sente uma mulher. Atuar de outra forma seria violar a garantia constitucional da isonomia e rechaçar um dos fundamentos da formação da Nação, que é a preservação da dignidade da pessoa humana, concluiu.
Processo nº: 644•45.2012.4.01.9380/MG
Assessoria de Comunicação
Tribunal Regional Federal da 1ª Região